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Systematics, biology and conservation of Unio tumidiformis Castro, 1885 (Unionidae: Bivalvia) in the South-West of the Iberian Peninsula

Author(s): Reis, Joaquim

Date: 2010

Persistent ID: http://hdl.handle.net/10451/2402

Origin: Repositório da Universidade de Lisboa

Subject(s): Mexilhões; Taxonomia; Crescimento; Reprodução; Conservação; Cativeiro; Península Ibérica; Teses de doutoramento - 2011


Description

Tese de doutoramento, Biologia (Biologia da Conservação), Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências, 2011

Freshwater mussels are amongst the most threatened animals on earth. Conservation efforts in Europe have suffered from the poor knowledge of the diversity and biological traits of the species. The objective of this dissertation was to clarify the systematics, taxonomy and biology of Unio tumidiformis and to evaluate the conservation challenges it faces. To achieve these objectives, the bibliography and the existing museum collections in Portugal, Spain and France were revised concerning the freshwater mussel fauna of the Iberian Peninsula, Central Europe and northern Africa. Samples were collected from around the Iberian Peninsula and from Morocco, and the population from the River Vascão (Guadiana Basin) was monitored for several years. From the 10 currently recognized Iberian species, U. tumidiformis is the only one not known from outside the Iberian Peninsula. It occurs in the southwestern basins of the Guadiana, Mira and Sado rivers. Most populations are small, isolated and show signs of severe decline. Only fish species belonging to the genus Squalius were identified as potential hosts for U. tumidiformis glochidia. This mussel appears to be strictly dioecious and presents a tachytictic mode of reproduction, releasing its glochidia in spring and summer. Complete metamorphosis is achieved quickly, and the growth rate of juveniles is very high, varying with the water quality. The mussels reach sexual maturity in the second year and fecundity is low, significantly increasing with size. These biological traits allow a fast generation renewal and efficient adaptation to a variable environment. There seems to be a trade-off between the reproductive output and gene flow that is related to the variation in flow regime. The increase in the frequency and persistence of extreme flow events may disrupt this balance and cause the decline of U. tumidiformis populations. Conservation actions should focus on ensuring adequate refuge areas in rivers including permanent water pools during summer, and reinforcing the mussel densities in threatened populations using juveniles reared in captivity.

Os mexilhões-de-rio ou náiades (Bivalvia: ordem Unionoida) estão entre os grupos faunísticos mais ameaçados do mundo. Nos Estados Unidos são mesmo considerados o grupo mais ameaçado, com inúmeras espécies já extintas e uma proporção muito significativa de espécies ameaçadas e protegidas a nível federal ou estatal. No entanto, os esforços para a conservação destas espécies não têm sido adequados em várias regiões do mundo, nomeadamente na Europa, devido a um conhecimento deficiente da diversidade específica existente. Este problema deriva, em parte, dos excessos cometidos pelos autores do século XIX, que descreveram centenas de espécies baseados em caracteres incipientes e, em parte, do reduzido esforço que foi feito posteriormente no sentido de esclarecer a sistemática do grupo. Foi só nos últimos 20 anos que se começou a assistir a um aumento progressivo do número de estudos de sistemática e taxonomia da família Unionidae na Europa, utilizando caracteres moleculares, morfológicos, do ciclo de vida, entre outros, os quais têm contribuído para o conhecimento da diversidade do grupo, para a avaliação do estado de conservação das espécies e das estratégias a implementar em cada caso. O principal objectivo da presente dissertação foi o estudo da sistemática, taxonomia, distribuição e biologia do mexilhão-de-rio Ibérico Unio tumidiformis Castro, 1885, com vista à avaliação do seu estado de conservação e à definição de propostas de medidas de gestão adequadas. Esta espécie não era considerada válida antes deste estudo, sendo as suas populações habitualmente consideradas como pertencendo a Unio crassus Retzius, 1788, uma espécie da Europa Central. A sistemática e a distribuição de U. tumidiformis foram estudadas numa vasta área incluindo a Península Ibérica e Norte de África (Marrocos, Argélia e Tunísia), recorrendo à bibliografia existente, à análise das colecções de moluscos dos Museus de História Natural de Lisboa, Coimbra, Porto, Madrid e Paris, e a amostragens nas príncipais Bacias Hidrográficas da Península Ibérica (Portugal e Espanha: Andaluzia, Aragão, Catalunha, Galiza e Castela-la-Mancha) e de Marrocos (todas as príncipais Bacias Hidrográficas a norte do Rio Oum Er Rbia até à fronteira com a Argélia). A biologia e a ecologia foram estudadas na Bacia do Guadiana, com especial destaque para o único rio que apresenta uma população sustentável, o Rio Vascão. Neste rio, as populações de mexilhões-de-rio e potenciais hospedeiros, assim como vários parâmetros ambientais, foram monitorizadas ao longo de dois anos para caracterizar o ciclo reprodutor; foi igualmente estudado o crescimento individual dos bivalves nesta população ao longo de sete anos, recorrendo a métodos directos (captura-recaptura) e indirectos (aneis de crescimento) em paralelo com a análise dos registos dos respectivos parâmetros ambientais. Os estudos efectuados recorrendo a marcadores morfológicos e moleculares permitiram identificar pelo menos seis espécies de mexilhões-de-rio em Portugal, representando 60% da diversidade ibérica. Das 10 espécies identificadas na Península Ibérica, apenas U. tumidiformis não foi encontrada em outras regiões Europeias ou do Norte de África, constituindo um endemismo ibérico potencial. No entanto, a análise da bibliografia e das colecções de moluscos do Museu Nacional de História Natural de Paris, indica a existência de uma espécie semelhante a U. tumidiformis e U. crassus no Norte de África. Não tendo sido localizada qualquer população dessa espécie, não foi possível analisar os vários caracteres que permitiriam revelar as suas relações com outras espécies, nomeadamente, U. tumidiformis. A diversidade de mexilhões-de-rio ibéricos terá tido origem em múltiplos eventos de colonização da Península, que explicam por que razão as espécies ibéricas apresentam mais semelhanças e são filogeneticamente mais próximas de espécies da Europa Central e do Norte de África do que entre si. A diferenciação das várias espécies terá sido potenciada pelo isolamento da Península Ibérica devido à formação dos Pirinéus e das várias bacias endorreicas durante o período Terciário, e ao isolamento do maciço Bético-Rifenho. O mexilhão-de-rio U. tumidiformis terá tido origem nesse maciço, colonizando posteriormente as áreas vizinhas através das rotas de dispersão da ictiofauna, sendo a sua extinção na Bacia Hidrográfica do Tejo aparentemente recente. Com excepção do Rio Vascão, as restantes populações conhecidas (Bacia do Mira: Rio Torgal; Bacia do Sado: Rio Sado e Ribeira da Marateca; Bacia do Guadiana: 13 populações em Portugal e 11 em Espanha) são pequenas ou muito pequenas e evidenciam uma regressão acentuada em toda a área de distribuição da espécie. Foram analisadas as potenciais espécies de peixes hospedeiros para os gloquídios de U. tumidiformis através do estudo de peixes capturados durante a o período de reprodução do bivalve, e através da realização de infestações em cativeiro. Os resultados indicam que as larvas do mexilhão apenas completam a metamorfose em peixes do género Squalius, tendo sido identificadas cinco espécies potencialmente adequadas: S. alburnoides, S. aradensis, S. carolitertii, S. pyrenaicus e S. torgalensis. Duas destas espécies, S. aradensis e S. Carolitertii, não ocorrem em simpatria com U. tumidiformis, o que reforça a ideia de que a ausência do mexilhão noutras Bacias Hidrográficas da Península Ibérica, em particular a norte da Bacia do Tejo, tem origem na sua história biogeográfica e não nas características do habitat. A metamorfose das larvas ocorre quase exclusivamente nas brânquias do hospedeiro, durante 6 a 14 dias a uma temperatura entre os 21,8 e os 26,1ºC. O estudo efectuado confirmou que o quisto que se forma em redor do gloquídio tem origem na migração das células epiteliais do hospedeiro, sendo muito semelhante ao processo de cicatrização. No entanto, o reconhecimento do parasita pelo hospedeiro (e vice-versa) deve ter origem em factores intrínsecos às espécies, não sendo um processo puramente mecânico. O estudo do ciclo de vida de U. tumidiformis evidenciou que se trata de uma espécie estritamente dióica, cujas fêmeas retêm as larvas por um curto período, libertando-as entre Fevereiro e Julho, provavelmente à medida que vão maturando. Não é conhecido qualquer mecanismo de atracção dos hospedeiros, sendo as larvas libertadas em pequenos grupos com pouca consistência. A fecundidade é reduzida (até 15.000 larvas por fêmea em cada época reprodutora) e directamente proporcional ao comprimento da concha. Estes factos apontam para a necessidade de algum factor que aumente a probabilidade de encontro entre os gloquídios e os hospedeiros, e que pode consistir apenas na redução do volume de água do rio e confinamento espacial durante a época de reprodução. Foram aplicados métodos de captura-recaptura e de contagem e medição de aneis de crescimento utizando o modelo de crescimento de von Bertalanffy. Os resultados revelaram que U. tumidiformis apresenta uma longevidade muito reduzida (inferior a 7 anos) quando comparada com outras espécies de mexilhões-de-rio, à qual está associada uma elevada taxa de crescimento e uma idade de maturação sexual precoce (2 anos). Estes factores permitem às populações uma rápida renovação de gerações, constituindo uma adaptação à vida em ambientes instáveis e permitindo aos bivalves maximizar a probabilidade de conseguirem reproduzir-se, antes de serem eliminados por um evento extremo como uma seca ou cheia. Para além disso permite uma rápida recuperação após a eventualidade de perdas importantes de efectivos populacionais. Esta estratégia deverá assentar também numa alternância entre anos “secos”, potenciadores de recrutamentos elevados devido ao reduzido volume de água e consequente aumento da probabilidade de encontro entre gloquídios e hospedeiros, e anos “húmidos”, em que a manutenção da conectividade dos rios durante a época de reprodução do bivalve permite a dispersão de larvas. Uma situação destas não só contribui para a manutenção do fluxo genético e para a re-colonização de locais onde poderão ter sido eliminados devido à estocacidade ambiental, como potenciará a fundação de novos núcleos populacionais. Perante um cenário de alterações climáticas em que fenómenos extremos como as secas e as cheias tenderão a ser cada vez mais frequentes, severos e persistentes, o equilibrio da alternância entre anos de elevado recrutamento e anos de elevada dispersão, pode sofrer alterações com efeitos irreversíveis, ao ponto das populações serem incapazes de recuperar por si sós. A situação é agravada pela reduzida longevidade desta espécie, que a levará à extinção mais rapidamente. Adicionalmente, as espécies de bivalves e peixes não indígenas podem constituir uma ameaça ao terem vantagem competitiva sobre as nativas em ambientes modificados, em que o regime lêntico predomina sobre o lótico, uma situação frequente com a redução anual da precipitação e agravada pela construção de açudes e barragens. As medidas de conservação que se recomendam passam, portanto, pela minimização dos impactos destes fenómenos extremos, através da estabilização dos leitos dos rios e da manutenção e protecção de pêgos permanentes, e pelo reforço dos efectivos das populações ameaçadas com juvenis criados em cativeiro. O controlo da expansão de espécies de peixes e bivalves exóticos é também essencial. Estas medidas irão permitir recuperar, manter ou mesmo aumentar os efectivos populacionais e o número de populações de U. tumidiformis a longo prazo, assegurando assim a conservação da espécie.

Document Type Doctoral thesis
Language English
Advisor(s) Pereira, Maria João Colares, 1952-; Araujo, Rafael(Rafael Araujo Armero)
Contributor(s) Repositório da Universidade de Lisboa
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