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Mesocarnivore site occupancy in cork oak landscapes: influence of management regimes

Author(s): Marques, Mariana Barroso

Date: 2017

Persistent ID: http://hdl.handle.net/10451/31559

Origin: Repositório da Universidade de Lisboa

Subject(s): Comunidades de carnívoros; Partição de nicho; Montado; Opções de gestão; Teses de mestrado - 2017; Domínio/Área Científica::Ciências Naturais::Ciências Biológicas


Description

Tese de mestrado em Biologia da Conservação, apresentada à Universidade de Lisboa, através da Faculdade de Ciências, 2017

A coexistência de espécies simpátricas é o foco de diversos estudos ecológicos. Em teoria, duas espécies semelhantes não podem coexistir no mesmo local, uma vez que irão competir pelos mesmos recursos e, portanto, a espécie mais forte irá prevalecer sobre a espécie mais fraca. Desta forma, a competição é uma das forças motrizes na estruturação e organização das comunidades de carnívoros. No entanto, na prática existem algumas nuances sobre esta teoria ecológica, sendo a principal a partição de nicho. Frequentemente nas comunidades de carnívoros se encontram mecanismos de segregação multidimensionais entre espécies simpátricas que traduzem a partição de nicho, quer seja uma partição espacial, temporal ou trófica. A segregação espacial é aquela que melhor se conhece entre espécies de carnívoros, no entanto, também temporalmente e a nível trófico as espécies podem diferir, sendo que se espera que tal aconteça ao longo de pelo menos um dos eixos. Os carnívoros são um grupo com uma grande diversidade, as espécies diferem entre si na morfologia, hábitos, preferências alimentares e de habitat. Desta forma, os carnívoros são um grupo com alguma plasticidade na resposta às condições ambientais e do ecossistema, tendo as espécies a possibilidade de ocupar diversos nichos, sempre considerando os seus requisitos ecológicos. Por outro lado, os carnívoros são um importante indicador do bom estado do ecossistema, pois sendo na sua maioria predadores têm um papel estrutural e regulador nas cadeias tróficas, baseado na comum interação predador-presa. Através de cascatas tróficas os carnívoros podem controlar as populações de presas, isto evita que se atinjam valores populacionais prejudiciais para o ecossistema no geral, incluindo para o Homem. No entanto, as cascatas tróficas funcionam também no sentido inverso, colocando os carnívoros numa posição de vulnerabilidade, pois qualquer alteração em níveis tróficos inferiores irá também afetar estas espécies. Isto torna-se especialmente preocupante quando existe uma redução significativa de presas habituais, provocando por consequência redução das populações de carnívoros. Para além da função estrutural, os carnívoros prestam outros serviços bastante importantes aos ecossistemas. Apesar de predadores, muitas vezes estas espécies recorrem a outros itens alimentares, especialmente frutas quando estas estão mais disponíveis no habitat. Deste modo, os carnívoros têm um papel relevante na dispersão de sementes, sendo que muitas vezes as depositam bastante longe do seu local de origem e muito frequentemente em áreas abertas com elevadas taxas de germinação. Muitas vezes esta taxa funciona também como controlo de reservatórios de agentes patogénicos, uma vez que algumas das espécies reservatório constituem presas de carnívoros. Contribuem assim para a redução do risco de contaminação para espécies domésticas e até para o Homem. A agricultura e práticas florestais são cada vez mais a fonte de destruição e fragmentação do habitat, uma das principais causas do declínio da biodiversidade. Com o aumento da população mundial, estas atividades de origem antropogénica cada vez mais têm posto em causa a persistência da biodiversidade. Atualmente, vários fatores ameaçam a biodiversidade de forma a comprometerem a sua subsistência, entre eles: a degradação e perda de habitat, vários tipos de poluição, sobre-exploração dos recursos naturais, introdução de espécies invasoras, catástrofes naturais, perturbações antropogénicas e caça e perseguição ilegal de espécies. Os carnívoros são um grupo especialmente suscetível a conflitos com o Homem, sendo que podem competir pelos mesmos recursos, causando muitas vezes casos de perseguição ilegal das espécies. Ameaças como a degradação do habitat pela agricultura, a sobre-exploração de recursos naturais ou outras atividades antropogénicas, bem como as catástrofes naturais, afetam as espécies pela diminuição de recursos disponíveis, assim como da sua qualidade. Isto acontece também na presença de espécies invasoras, que competem com as espécies nativas pelos mesmos recursos. Os ecossistemas mediterrânicos têm para além de um importante valor natural, também um valor cultural incutido, pois foram ao longo de várias décadas o resultado da interação do Homem com a vida selvagem. Esta interação por vezes ocorre pacificamente e de forma estável e noutras ocasiões de uma forma mais conflituosa, como referido anteriormente. O montado de sobro é um biótopo típico do mediterrâneo que evidencia o papel do Homem na modelação da paisagem. Sendo um habitat modificado, o montado de sobro é constituído por uma camada arbórea de sobreiros (Quercus suber) e/ou azinheiras (Quercus rotundifolia), complementada com subcoberto diverso, mais ou menos denso, dependendo dos locais e das atividades antropogénicas desenvolvidas. O montado é um sistema agro-silvo-pastoril, que integra a produção animal, extração de cortiça e cultivo de cereais, bem como outras atividades agrícolas e florestais. Simultaneamente, providencia vários benefícios estéticos e recreativos, serviços de ecossistema, assim como um habitat adequado a várias espécies. Muitas vezes encontramos no montado manchas de outros biótopos, nomeadamente plantações como os pinhais ou eucaliptais, áreas de matagais mediterrânicos ou galerias ripícolas. A combinação dos diferentes habitats cria heterogeneidade na paisagem o que, de uma forma geral, beneficia os carnívoros e outra biodiversidade. Em Portugal, as zonas de montado encontram-se mais a Sul do país e contam com 10 das 14 espécies de mesocarnívoros, ou seja, carnívoros de porte médio-pequeno (< 15kg). Apesar da coexistência das espécies de carnívoros com os humanos em áreas semi-naturais, mudanças atuais na intensidade de gestão têm ocorrido como duas tendências. Por um lado, a intensificação das práticas agrícolas e pecuárias e consequentemente aumento de diversas perturbações antropogénicas nestas áreas. Por outro lado, o abandono de áreas anteriormente usadas para usos tradicionais do solo, que consistiam em sistemas de pousio e rotação, mas geralmente associadas a pouca intervenção humana. Isto poderá levar a uma alteração das comunidades de carnívoros em sistemas agro-silvo-pastoris, uma vez que estamos perante práticas que originam modificações na paisagem e usos do solo. Desta forma, o principal objetivo deste estudo é perceber de que forma é que as opções de gestão têm um papel estruturante nas comunidades de carnívoros. Para tal foram analisadas duas áreas próximas geograficamente e com características ambientais e ecológicas semelhantes, o que pressupõe também comunidades de carnívoros semelhantes. Uma das áreas, a Companhia das Lezírias S.A., é a maior exploração agro-silvo-pastoril do país, contando com variadas atividades de produção e uma grande intervenção humana no habitat, originando várias alterações nos usos do solo. Em alternativa, a outra área de estudo é o Campo de Tiro de Alcochete, que é uma base militar pertencente à Força Aérea Portuguesa e onde ocorrem diversos exercícios militares. No entanto apesar desta fonte de perturbação, esta área apresenta poucas opções de gestão, mantendo o uso do solo mais estável e natural do que a área anterior. Previu-se inicialmente, que de uma forma geral, a heterogeneidade da paisagem beneficie a comunidade de carnívoros, ao contrário de todas as atividades que impliquem um ecossistema mais homogéneo. Por outro lado, atividades que promovam uma redução significativa do subcoberto esperam-se que prejudiquem as espécies pela perda de recursos alimentares e de abrigo, ao contrario de atividades que mantenham o subcoberto. Atividades agrícolas devem favorecer espécies mais generalistas como a raposa, o sacarrabos e o texugo que beneficiam de recursos alimentares providenciados por estas, contrariamente às espécies menos generalistas, tal como a geneta e fuinha. Finalmente, maior intensidade de gestão prevê-se que prejudique mais espécies como a fuinha e geneta, que requerem ambientes menos modificados em comparação com a raposa e o sacarrabos. Para testar estas hipóteses utilizei dados adquiridos em 2013 e 2014 referentes à Companhia das Lezírias e recolhi um conjunto semelhante de informação no Campo de Tiro de Alcochete. Para tal, foram instaladas estações de foto-armadilhagem para amostrar espécies de carnívoros por toda a área de estudo. A amostragem decorreu entre Novembro de 2016 e Maio de 2017. Foram estabelecidas 66 estações de armadilhagem fotográfica ao longo de toda a área, sendo que a amostragem foi dividida em três fases, cada uma com 22 quadrículas amostradas. No total, cada quadrícula foi amostrada três vezes o que resultou num total de 45 dias de amostragem em casa estação. Simultaneamente, foram recolhidas variáveis potencialmente explicativas dos padrões de ocupação e de intensidade de uso do habitat pelas espécies. Estas variáveis pertencem a três categorias cruciais na sobrevivência dos carnívoros: habitat, presas e perturbação. As variáveis foram medidas em buffers com raio de 350m em redor do local exato de instalação de cada câmara. Todos os dados referentes ao Campo de Tiro, tanto de capturas de carnívoros como as variáveis correspondentes a cada estação de amostragem, foram aplicados em modelos de ocupação e de intensidade de uso do habitat, single season single species e N-mixture, respetivamente. Em cerca de 6 meses de amostragem, que equivaleram a 2874 dias de foto-armadilhagem, foi obtido um total de 505 capturas independentes de carnívoros. Isto é, foram consideradas capturas independentes todas as ocasiões em que um indivíduo da mesma espécie era fotografado com pelo menos 30 minutos de intervalo, a não ser que fosse possível distinguir mais do que um indivíduo. A comunidade de carnívoros do Campo de Tiro tem ocupações naïve iguais ou superiores a 30%, o que significa que estamos perante uma comunidade saudável, com espécies relativamente bem distribuídas pela área. A raposa é a espécie melhor distribuída (ocupando 85% da área de estudo), seguida do sacarrabos, depois a fuinha, a geneta e por fim o texugo, com menor ocupação da área de estudo. Tendo em conta os resultados obtidos na Companhia das Lezírias, a raposa, o sacarrabos e o texugo têm maiores valores de ocupação naïve nesta área, pelo contrário a geneta e fuinha estão melhor distribuídas no Campo de Tiro. Os resultados dos modelos comprovam as diferentes preferências das espécies de carnívoros, o que se traduz na existência de partição de nicho. Os modelos gerados para as duas áreas evidenciam que na área com maior perturbação pelas opções de gestão, a Companhia das Lezírias, o habitat torna-se o mais significativo na distribuição e abundância das espécies. Opostamente, numa área mais homogénea e com poucas opções de gestão, o Campo de Tiro, são as fontes de perturbação que aparentam ser as variáveis mais relevantes na ocupação das espécies. A comparação dos resultados em ambas as áreas permite inferir que de facto as opções de gestão têm um papel importante na estrutura e organização das comunidades de carnívoros. Isto porque, em áreas próximas e similares onde as comunidades de carnívoros eram expectáveis que fossem semelhantes, a intensidade de gestão origina diferenças na composição das mesmas, bem como resulta na exploração de diferentes nichos pelas mesmas espécies em ambas as áreas. Apesar das diferenças encontradas nas opções de gestão, ambas as áreas de estudo apresentam um mosaico de habitats heterogéneo. Isto parece beneficiar a comunidade de carnívoros uma vez que estes se encontram de uma forma geral, bem distribuídos e em abundância tanto numa área como noutra. No entanto, os resultados obtidos também revelam a importância dos matos mediterrânicos no subcoberto, ao se detetar um efeito negativo do pastoreio na intensidade de uso do habitat pelas espécies, tanto na Companhia das Lezírias como no Campo de Tiro. Adicionalmente, as espécies mais generalistas ocorrem em maior abundância na Companhia das Lezírias, onde as práticas agrícolas providenciam novas e diferentes fontes de alimento. Por outro lado, as espécies menos generalistas apresentam maior abundância no Campo de Tiro de Alcochete uma área com menos práticas agrícolas. A relevância deste trabalho prende-se pelo conhecimento científico que adiciona àquilo que já era conhecido sobre a influência antropogénica nos carnívoros e como as suas comunidades respondem. Verificou-se que frequências e intensidades distintas nas atividades de gestão têm diferentes implicações na paisagem e consequentemente na comunidade de carnívoros, afetando as espécies de diferentes formas. Com os resultados obtidos pretende-se também criar políticas de gestão para os sistemas mediterrânicos semi-naturais, com vista à conservação das espécies de carnívoros. A tomada de decisão sustentada por dados científicos e robustos, torna-se cada vez mais importante e deve ser considerada em áreas com uma grande incidência de opções de gestão.

The coexistence of sympatric mesocarnivore species maybe possible due to niche partitioning mechanisms. Co-occurring species segregate along different niche dimensions, through different habits and preferences. In this way mesocarnivores can minimize competitive interactions as well as adapt to ecosystem changes. The cork oak (Quercus suber) montado is a semi-natural Mediterranean system, where the constant human intervention has been shaping the landscape and its features over time, for instance by varying land uses and understory structure. Associated with this, management options for agricultural, forestry and livestock raising practices promote habitat diversification. The mosaic of different habitat patches provides resources to several species, including carnivores, and this heterogeneity allows them to fill in different niches. To understand how carnivores respond to landscape changes induced by management options at the farm level, two similar mesocarnivore communities were assessed. These communities inhabit adjacent areas within a cork oak woodland matrix, however subjected to different management and consequently different anthropogenic disturbances. Using a camera trapping approach and ecological modelling procedures, I evaluated the occupancy (presence/absence data) and intensity of habitat use (use frequency) patterns of five mesocarnivore species: red fox (Vulpes vulpes), stone marten (Martes foina), European badger (Meles meles), common genet (Genetta genetta), Egyptian mongoose (Herpestes ichneumon). Simultaneously environmental variables that represent three categories needed for carnivores survival: habitat, preys and disturbance factors, were measured. All five species were present in the two study areas, with a total of 505 captures during 2874 trap-days, which can be translated in 17.6 captures per 100 days. Habitat use intensity was best explained by environmental variables than space occupancy patterns. In general, in the intensively managed area, habitat variables measuring the effects of human intervention were more important predictors of carnivore habitat use intensity, for instance riparian vegetation and montado with different shrubs density. On the other hand, carnivore species in the area with less intensive management respond firstly to disturbance sources like for example livestock and wild boar abundances and military activities. These results suggest that management options have an important role in structuring mesocarnivores community. Individually each species responded differently to the considered factors, promoting segregation along space and therefore coexistence.

Document Type Master thesis
Language English
Advisor(s) Reis, Margarida Santos,1955-; Santos, Maria João
Contributor(s) Repositório da Universidade de Lisboa
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