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Does hallucinatory predisposition influence voice processing? : probing the interactions between speech, identity, and emotion

Author(s): Fernandes, António João Farinha

Date: 2017

Persistent ID: http://hdl.handle.net/10451/33332

Origin: Repositório da Universidade de Lisboa

Subject(s): Esquizofrenia; Psicoticismo; Alucinações auditivas verbais; Reconhecimento de fala; Teses de mestrado - 2017; Domínio/Área Científica::Ciências Sociais::Psicologia


Description

Tese de mestrado, Psicologia (Secção de Psicologia Clínica e da Saúde, Núcleo de Psicoterapia Cognitiva-Comportamental e Integrativa), Universidade de Lisboa, Faculdade de Psicologia, 2017

Auditory verbal hallucinations (AVH) are a core symptom of psychotic disorders such as schizophrenia, although similar experiences have been widely reported in nonclinical samples. Due to these observations, a dimensional approach to the understanding of these symptoms has been in discussion: the continuum model of psychosis. One of its assumptions is that the experiences observed in both clinical and nonclinical groups rely on similar cognitive and neural mechanisms. For example, psychotic patients reveal impairments in the recognition of their own speech, often attributing it to an external source, particularly when it carries negative content. This could also be the case in nonclinical samples experiencing hallucinations, although more studies probing voice perception in these individuals are needed, to assess the existence of similar impairments. We recruited nonclinical participants with different scores on the Launay-Slade Hallucination Scale-Revised. They pre-recorded words and vocalizations that were subsequently used in a set of tasks. We assessed voice identity processing at both the discrimination and recognition levels, while taking into account the interactions between the three main voice dimensions: speech, identity, and emotion (Experiment 1). We also wanted to explore if these potential differences could be related to differences in the emotional evaluation of the voice stimuli (Experiment 2). Our results suggest that hallucinatory predisposition is associated with differences in the voice recognition processes: there was an association between lower performance in recognizing one’s own speech and a higher predisposition for auditory hallucinations, particularly when listening to vocalizations not carrying semantic content. We did not find an association between these impairments and negative emotional content of the auditory stimuli, as observed in previous studies with patients. However, our study suggests that the processes involved in the recognition of self-produced vocal stimuli could underlie the experience of auditory hallucinations in nonclinical individuals.

Nos últimos anos, tem surgido um interesse cada vez maior no estudo de manifestações sintomáticas observadas em camadas não-clínicas da população (e.g., Broyd et al., 2016; Powers, Kelley, & Corlett, 2016). Este tipo de sintomas ou experiências, cuja descrição surge habitualmente ligada a perturbações diagnosticáveis, nem sempre estão associados a um mal-estar significativo nos indivíduos ou a uma necessidade de ajuda psicoterapêutica ou psiquiátrica (e.g., Daalman, Diederen, Hoekema, Lutterveld, & Sommer, 2016). Assim, ainda não é claro se estas manifestações – ou quais delas – estão associadas a fases mais precoces de uma perturbação, ou constituem simplesmente traços ou estados dos indivíduos sem um risco clínico (e.g., Johns et al., 2014; Yung et al., 2009). A progressão sintomática varia fortemente de indivíduo para indivíduo, e isto tem levado ao surgimento de novas abordagens dimensionais que possam alargar o estudo da psicopatologia além das categorias já existentes, contribuindo assim para a exploração da emergência transdiagnóstica dos sintomas (e.g., Nelson, McGorry, Wichers, Wigman, & Hartmann, 2017; iniciativa RDoC em Yee, Javitt, & Miller, 2015). As perturbações psicóticas têm sido um foco deste tipo de abordagens mais dimensionais, uma vez que experiências habitualmente associadas a perturbações como a esquizofrenia – por exemplo, experiências anómalas na perceção de voz, similares a alucinações auditivas – têm vindo a ser observadas na população em geral, muitas vezes sem mal-estar associado (e.g., Strauss, 1969; van Os, 2003; Yung et al., 2009). Uma destas abordagens, que tem sido sujeita a uma vasta discussão na literatura científica, é o modelo do contínuo das experiências psicóticas (e.g., Badcock & Hugdahl, 2012; van Os, Linscott, Myin-Germeys, Delespaul, & Krabbendam, 2009). Este modelo sugere que a experiência deste tipo de sintomas se distribui ao longo de um contínuo entre o funcionamento saudável e o funcionamento psicopatológico, não estando necessariamente associada à presença de perturbação (van Os et al., 2009). Além disso, o modelo sugere também que os sintomas das populações clínica e não-clínica poderão ter subjacentes os mesmos mecanismos cognitivos e neurológicos (Badcock & Hugdahl, 2012). Contudo, são necessários mais estudos que ajudem a esclarecer se estamos a discutir o mesmo tipo de experiências, com as mesmas origens, nestas diferentes camadas da população. Um dos sintomas comuns em perturbações psicóticas, como a esquizofrenia, que tem sido reportado em indivíduos sem perturbação são as alucinações auditivas verbais (e.g., Daalman et al., 2011; Sommer et al., 2010). Vulgarmente descritas como “ouvir vozes”, estas experiências ocorrem sem qualquer estimulação externa (American Psychiatric Association, 2013). Embora existam vários modelos explicativos para a sua origem, um dos mais relevantes é o que associa estas experiências a anomalias no processamento da voz, particularmente da voz do próprio indivíduo (ver Conde, Gonçalves, & Pinheiro, 2016a para uma revisão). Estudos com pacientes com esquizofrenia, e que sofrem de alucinações auditivas, têm revelado que estes têm maior dificuldade em reconhecer a sua própria voz quando ouvem excertos auditivos da mesma, muitas vezes atribuindo-a a uma fonte externa (e.g., Allen et al., 2004; Johns et al., 2001). Este viés externalizante parece ainda acentuar-se com a severidade das alucinações destes pacientes, bem como quando o conteúdo dos excertos ouvidos é negativo ou injurioso (Pinheiro, Rezaii, Rauber, & Niznikiewicz, 2016). Este é um exemplo do tipo de anomalias de perceção de voz que requer estudos com amostras nãoclínicas que reportem experiências alucinatórias semelhantes. É importante averiguar a existência do mesmo tipo de alterações no processamento da voz destes sujeitos, de forma a perceber se os mesmos mecanismos cognitivos e neurológicos lhes estão subjacentes. Ao estudar perceção de voz, devem ser tidos em conta não só diferentes níveis de processamento, como também os diferentes tipos de informação contida nos estímulos vocais (e.g., Belin, Fecteau, & Bédard, 2004; van Lancker & Kreiman, 1987). Vários estudos com pacientes que sofreram lesões cerebrais sugerem que a discriminação e o reconhecimento da identidade da voz podem ser vistos como dois níveis de processamento distintos, podendo ser estudados em separado (e.g., van Lancker & Kreiman, 1987; van Lancker, Kreiman & Cummings, 1989). A discriminação de voz é maioritariamente feita com recurso às propriedades acústicas dos estímulos vocais (processos mais bottom-up; e.g., Chhabra, Badcock, Maybery, & Leung, 2014), enquanto que o reconhecimento envolve a integração de informação específica sobre a identidade de quem produziu esses estímulos vocais, recrutando mais recursos atencionais (processos mais top-down; e.g., Conde, Gonçalves, & Pinheiro, 2015; Sohoglu, Peelle, Carlyon, & Davis, 2012). No processamento da voz estão ainda envolvidos diferentes tipos de informação linguística e paralinguística, que dizem respeito ao discurso/conteúdo semântico, à identidade, e à emocionalidade (e.g., Belin et al., 2004; Schirmer & Adolphs, 2017). O nosso estudo teve em conta todos estes aspetos, estudando a perceção de voz de uma amostra não-clínica e composta por participantes com níveis variados de predisposição para experiências alucinatórias. Neste estudo participaram 32 indivíduos recrutados através das suas pontuações (baixas, intermédias e altas) na Escala de Alucinações de Launay-Slade Revista (adaptação portuguesa de Castiajo & Pinheiro, 2017; Larøi & van der Linden, 2005; originalmente desenvolvida por Launay & Slade, 1981). Este é um instrumento que tem sido usado previamente em estudos sobre a prevalência de experiências alucinatórias nas populações clínica e não-clínica (e.g., Morrison et al., 2000; Serper, Dill, Chang, Kot, & Elliot, 2005). Numa primeira sessão, os participantes gravaram excertos da sua própria voz, que envolviam tanto palavras como vocalizações. Mais tarde, numa segunda sessão, os participantes realizaram duas experiências comportamentais com recurso a um computador. Na Experiência 1, foi pedido aos participantes que discriminassem ou reconhecessem a identidade de excertos de voz, que incluíam a sua própria voz e a voz de uma outra pessoa desconhecida. Nesta experiência, os julgamentos eram feitos explicitamente sobre a identidade dos estímulos, com as dimensões do discurso/conteúdo semântico e da emocionalidade dos estímulos a serem analisadas de forma implícita. Na Experiência 2, foi pedido aos participantes que avaliassem as propriedades emocionais dos estímulos apresentados. Nesta experiência, os julgamentos eram feitos explicitamente sobre as propriedades emocionais dos estímulos, com as dimensões do discurso/conteúdo semântico e da identidade dos estímulos a serem analisadas de forma implícita. No que diz respeito à primeira experiência (foco na identidade dos estímulos), os nossos resultados apontam para diferenças nos processos de discriminação e reconhecimento da identidade da voz, relacionadas com os diferentes tipos de informação contida nos estímulos vocais. Na discriminação, os participantes apresentaram melhor desempenho quando ouviam palavras, do que quando ouviam vocalizações. Também apresentaram melhor desempenho quando os estímulos vocais envolviam a sua própria voz e quando envolviam conteúdo positivo. Estas diferenças não foram influenciadas pela variabilidade individual na predisposição para experiências alucinatórias. Contudo, foram também encontradas diferenças nos processos de reconhecimento da identidade da voz, essas sim influenciadas pela variabilidade na predisposição para experiências alucinatórias da nossa amostra. Uma análise de correlações subsequente revelou que, quanto maior a predisposição para alucinações – particularmente, alucinações auditivas –, pior o desempenho no reconhecimento de vocalizações positivas e produzidas pelo próprio indivíduo. Finalmente, no que diz respeito à segunda experiência (foco nas propriedades emocionais dos estímulos), os nossos resultados sugerem que existe uma tendência para avaliar de forma mais extrema (mais positiva ou mais negativa) vocalizações que envolvem a voz do próprio. Estas diferenças nos julgamentos dos participantes não foram, contudo, influenciadas pela variabilidade individual na predisposição para experiências alucinatórias. Em suma, os nossos resultados têm implicações importantes para a discussão do modelo do contínuo das experiências psicóticas (e.g., Badcock & Hugdahl, 2012; van Os et al., 2009), particularmente no que diz respeito ao reconhecimento da identidade da voz e ao conteúdo semântico ou não dos estímulos. Os resultados apontam para uma associação entre o pior desempenho no reconhecimento de estímulos vocais produzidos pelo próprio – particularmente vocalizações, sem conteúdo semântico – e uma maior predisposição para alucinações. Isto vai ao encontro da observação prévia de défices nos processos de reconhecimento em pacientes psicóticos (e.g., Allen et al., 2004; Johns et al., 2001) e sugere que o reconhecimento da identidade da voz poderá ser um mecanismo subjacente tanto em grupos clínicos, como não-clínicos, que experienciam alucinações auditivas. Contudo, não foi encontrada uma associação entre a predisposição para experiências alucinatórias e um pior reconhecimento de estímulos com emocionalidade negativa, algo que foi previamente observado em estudos com pacientes (Pinheiro et al., 2016). Ainda assim, isto está também em linha com evidência prévia que sugere que a experiência de alucinações auditivas poderá estar mais relacionada com o processamento das dimensões da identidade e do discurso/conteúdo semântico, do que com o processamento da emocionalidade (ver Conde et al., 2016a para uma revisão).

Document Type Master thesis
Language English
Advisor(s) Pinheiro, Ana P.
Contributor(s) Repositório da Universidade de Lisboa
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